Com perfil 100% urbano, equipamento de série muito completo – incluindo as malas laterais – e o motor da Africa Twin, a Honda NT1100 é uma viajante sofisticada, capaz de nos levar longe mas sempre conectados ao mundo real.
Texto Ricardo Ferreira . Fotos @Pedro Fernandes
Nem todos querem uma Adventure para viajar, muitos procuram uma moto de turismo simples, mas com uma lista de especificações rica e algum ADN desportivo - que lide bem com as deslocações rápidas durante a semana, mas sempre pronta para um passeio prolongado, com duas pessoas e totalmente carregada. Ou seja, um 'dois em um'. Pensando assim, a Honda NT1100 pode ser a chave para essa pretensão.
É uma moto de viagem confortável e confiável como as "antepassadas" Deauville e Pan-European, mas versátil, ágil e leve (238 kg em ordem de marcha com o depósito cheio e malas) como uma crossover. Com a caixa semi-automática DCT o peso sobe para 248 kg, mas torna-se ainda mais sofisiticada.
Em termos de construção, o quadro e o motor da NT1100 são os mesmos da Africa Twin 1100, com pequenas modificações para adaptá-los ao uso puramente estradista.
Por exemplo, o bicilíndrico de 1.084cc ainda tem 102 cv, mas o binário máximo de 104 Nm é obtido em rotações mais baixas; as rodas, por outro lado, são ambas de 17 polegadas. O equipamento eletrónico de bordo é completado com três mapeamentos (Urban, Rain, Tour), controle de tração (não do tipo curvas), anti-cavalinho, travão-motor e gerenciamento da resposta do motor ao abrir o acelerador.
A carenagem, o grande pára-brisas regulável em altura de 16 cm e os ‘spoilers’ para as mãos e pernas protegem-nos, isolando-nos numa espécie de “bolha” para viajar com total conforto.
O extenso equipamento de série inclui malas laterais (33 litros para a esquerda, 32 litros para a direita), punhos aquecidos, suporte central e tomadas USB de 12V. Por último, e não menos importante, os preços que acabam por ser atrativos face ao muito que é oferecido: a NT 1100 custa 14.675 euros na versão com caixa de velocidades "normal" e 15.700 euros (mais 1.025 euros) com a caixa de velocidades sequencial automática DCT, precisamente a versão que utilizámos no teste.
ESTÉTICA E CONSTRUÇÃO *** (3 estrelas)
Com uma frente que faz lembrar as maxi-scooter, muito próxima do estilo da X-ADV 750, aliando esse factor à sua versatilidade, vejo a NT1100 como uma ‘turismo utilitária’. Não tem nem o espírito ‘nómada’ da Africa Twin, nem o luxo do Expresso do Oriente que motos de Grande Turismo como a Honda GL 1800 Goldwing e BMW K 1600 GT imitam de forma indelével, mas consegue ser tão eficiente em viagens longas como no quotidiano diário. Essa versatilidade é um ítem a ter em conta no ato de compra.
Outro, a sua qualidade de construção que deixa pouco espaço a críticas. Tudo está no lugar, com bons acabamentos e um suave toque de austeridade, porque acima de tudo a Honda procurou limitar o aumento nos custos de produção desta moto (ausência de suspensões eletrónicas, pára-brisas elétrico, transmissão por cardan, etc.), por forma a oferecer um preço que não superasse a barreira dos 15.000 euros na versão DCT.
Apesar disso, a NT1100 é completa no equipamento, tem bons acabamentos, é fabricada no Japão (Kumamoto) e tem garantia de 2 anos sem limite de quilometragem.
ERGONOMIA ****
Importante saber numa moto desta categoria, é saber se consegue acomodar perfeitamente o condutor e passageiro. A primeira impressão é que vamos estar bem protegidos do vento e intempéries pela carenagem frontal, com um écran alto, defletores superiores e inferiores ao redor dos braços e parte inferior do corpo.
O assento culmina em 820 mm e não é ajustável em altura, o que é pena. No entanto, encaixo bem com os meus 1,82m de altura e chego bem com os pés ao solo, mas acredito que alguém com 1,68m de altura terá de ficar em pontas de pés, apesar de melhor protegido atrás da ‘bolha’ transparente da deslocação do ar. A propósito, a tela oferece ajuste de 5 níveis para altura e ângulo num total de 164 mm entre a posição alta/baixa.
Para o passageiro, obviamente, será necessário subir na parte de trás por causa das malas , mas uma vez no lugar a posição é tão acolhedora quanto nas grandes trails. Caso os pousa- pés traseiros tivessem cobertura de borracha, o conforto seria perfeito.
Uma grande alça de apoio para o passageiro estende-se da bagageira traseira. Irrepreensível é o lugar reservado ao condutor, com um triângulo guiador-assento-peseiras muito bem feito e borracha nos pousa-pés que evitam sentir quaisquer vibrações. Além disso, a NT1100 revela o seu espírito cross-over com uma posição de pé completamente aceitável, o que deriva certamente da semelhança do quadro com a Africa Twin 1100.
MOTOR ****
O motor da NT1100 destaca-se essencialmente no uso diário e viagens. Conheço-o bem da Honda Africa Twin, mas não nesta versão com caixa DCT que, confesso, obrigou-me a algum período de adaptação, até porque não é fácil sentir a falta do selector de pedal... mas foi uma questão de tempo.
No único dia de piso seco que encontrei, sem problemas, mas nos dias chuvosos que se seguiram, tive (obrigatoriamente!) que habituar-me a deixar levar por ele, ou seja, deixar de colocar as rotações a mandar na tração da roda traseira ao meu gosto, para deixar as ajudas eletrónicas resolverem o assunto. Sobretudo, senti-me seguro no molhado, o que é o mais importante!
Fiquei sem dúvidas sobre a eficácia da caixa com dupla embraiagem DCT, parecendo-me ajustada pelos técnicos da Honda, tanto para o conforto de condução, quanto para a sua filosofia, utilitária e turística.
A transmissão final é por corrente, o que é normal dado que este é o motor da Africa Twin 1100 DCT, mas recordando a suavidade da NT700V Deauville com veio de cardã, acredito que a NT 1100 pudesse ser um pouco mais dócil na transição de marchas, mas lá está... isso encarecia a moto e aumentaria significativamente o peso. Isto porque, se só o DCT aumenta em 10 quilos a moto para 248 kg, imaginem o que não seria com o veio de cardã.
De positivo o que notei foi a flexibilidade do bicilíndrico em linha a baixas velocidades, assim como a sua capacidade de aceleração a médios regimes. É nesse ponto que ele sai da casca, permitindo por exemplo ultrapassagens bastante vivas. Em estrada, ronrona a 130 km/h sem dificuldades, e mesmo sem um andamento consevador, esticando uma ou outra vez a NT1100, consegui uma média de 6,5 l/100 km durante o teste num percurso misto entre montanha e auto-estrada. No geral e numa toada mais calma, acredito perfeitamente que seja possível chegar aos 5 l/100 km.
Em resumo, este motor regulado a 270°, para além de emitir um som bastante agradável se não for amplo, demonstra que a sua zona de conforto são as rotações médias. É ai que é cheio, redondo, quase musculoso.
COMPORTAMENTO ****
Antes de experimentar a NT1100, tenha a noção que é uma moto ágil, leve mais que não é propriamente uma desportiva. É sim uma verdadeira moto de estrada com vocação para trajetos urbanos e para viajar, contando para isso com suspensões flexíveis e com um curso bastante generoso (150 mm à frente/atrás).
Revela uma transferência de massa acentuada ao travar muito repentinamente - apenas com o travão dianteiro – com um ressalto acentuado, mas fora isso passam despercebidos na condução os 248 kg da NT1100 DCT, inclusivé em mudanças bruscas de sentido em cidade e no estacionamento. Em zonas montanhosas, para fazer as curvas com toda a serenidade, eficiência e fluidez, deve-se usar o travão traseiro para baixar a moto e depois girá-la com o olhar sem precisarmos de movimentar muito o corpo sobre o assento. A NT1100 vira muito bem usando o guiador e sem necessidade de contra-peso com o corpo – quase como uma maxi-scooter.
Com esse comportamento flexível, a NT1100 é uma moto muito diferente de uma Yamaha Tracer 9 GT, mais rígida e mais desportiva na essência. A Honda implora-nos para ser conduzida de forma suave, sinuosa e sem improvisar muito como um piloto de ralis. Se o fizermos, segura-se na estrada muito bem e trava muito bem. Acreditem que com as suas suspensões flexíveis, finalmente encontramos a moto para não nos termos que erguer do assento a cada ressalto na estrada... uf, um descanso para os rins!
Para completar esse quadro, o conforto do passageiro é muito bom e a proteção realmente satisfatória. O pára-brisa alto protege muito bem na estrada e os defletores laterais baixos protegem bem os pés... inclusive da chuva que encontrámos. Nada mal! No piso molhado que encontrámos, tivemos alguns alertas de aderência entre a frente e a traseira, mas não só quadro e pneus fizeram bem o seu trabalho, como a capacidade interventiva da electrónica foi fantástica, regulando automaticamente as rotações do motor. Definitivamente, os tempos são outros!
EQUIPAMENTO DE SÉRIE *****
A Honda NT1100 DCT vem equipada de série com um regulador de velocidade (cruise control), punhos aquecidos ajustáveis, tomada de 12 volts (portas USB C), porta-bagagens traseiro, malas laterais com cerca de 62 litros no total (provenientes da X-ADV 750) e cavalete central.
A tudo isto soma-se a tela ‘toutch’ TFT de 5 polegadas que inclui Apple CarPlay , Android Auto e conectividade Bluetooth, de muito fácil leitura e com todas as informações que precisamos, ao que se juntam as luzes LED completas (com DRL), indicadores de autocancelamento e sinais de paragem de emergência.
CONCLUSÃO
A Honda NT1100 dirige-se a todos aqueles que anseiam por uma genuína moto de estrada, simples na sua concepção, diferente a nível técnico (caixa semi-automática DCT), mas sem aspetos supérfluos para muitos (suspensões eletrónicas, pára-brisas elétrico, etc.) que procuram um bom preço no acto de compra.
De facto, há motos de turismo mais potentes no mercado, mais desportivas na ciclística, mas a NT1100 DCT mostra muitas qualidades, como conforto, prazer de condução e uma notável relação preço-equipamento de série. A sua maior força é a meu ver a sua simplicidade, praticidade e versatilidade.
FICHA TÉCNICA
TIPO DE MOTOR bicilíndrico paralelo a 270°, 4 tempos, Unicam 8 válvulas, refrigeração líquida
CILINDRADA (cm3) 1.084 cc
DIÂMETRO X CURSO (mm) 92 mm x 81,5 mm
TAXA DE COMPRESSÃO 10,1 : 1
POTÊNCIA MÁXIMA 75kW/7,500 rpm
BINÁRIO MÁXIMO 104Nm/6,250 rpm
ALIMENTAÇÃO Sistema de injeção programada de gasolina (PGM-FI)
EMBRAIAGEM Multidisco em banho óleo
TRANSMISSÃO FINAL Corrente
CAIXA DE VELOCIDADES Transmisão de dupla embraiagem (DCT) de 6 velocidades
Quick Shifter opcional
QUADRO Berço duplo
ÂNGULO DA COLUNA DE DIRECÇÃO 26.5°
TRAIL (mm) 108 mm
SUSPENSÃO DIANTEIRA Forquilha telescópica invertida SHOWA SFF-BP de 43 mm, com afinação de pré-carga e ajuste de amortecimento, curso de 150 mm
SUSPENSÃO TRASEIRA Braço oscilante de alumínio fundido monoblock com Pro-Link® com amortecedor de gás, afinação hidráulica de pré-carga e ajuste de amortecimento, curso de 150 mm
TRAVAGEM DIANTEIRA 2 discos flutuantes de 310 mm com maxilas de 4 pistões de acionamento hidráulico e montagem radial
TRAVÕES TRASEIRA 1 disco de 256 mm com maxila de 1 pistão de acionamento hidráulico
RODA DIANTEIRA 120/70ZR17 M/C (58W)
RODA TRASEIRA 180/55ZR17 M/C (73W)
DIMENSÕES (mm) 2.240mm x 865mm x 1.360mm
ALTURA DO ASSENTO (mm) 820 mm
DISTÂNCIA ENTRE EIXOS (mm) 1.535 mm
DEPÓSITO DE COMBUSTÍVEL (Litros) 20,4 L
PESO EM ORDEM DE MARCHA (kg) 248 Kg
PVPR: 15.700€
CONCORRENTES
Yamaha Tracer 9 GT
Motor
Motor 3 cilindros,Potência máxima 119 cv a 10.000 rpm, Cilindrada 890cc Peso (incluindo óleo e gasolina) 220 kg
PVPR: 14.295€
BMW F900 XR
Motor 2 cilindros,Potência máxima 105 cv a 8.5000 rpm, Cilindrada 895cc Peso (incluindo óleo e gasolina) 219 kg
PVPR: 12.170€
MV Agusta Turismo Veloce Lusso
Motor 2 cilindros,Potência máxima 110 cv a 10.150 rpm, Cilindrada 798cc Peso (incluindo óleo e gasolina) 199 kg
PVPR: 21.459€
Suzuki GSX-S 1000 GT
Motor 4 cilindros,Potência máxima 152 cv a 11.000 rpm, Cilindrada 999cc Peso (incluindo óleo e gasolina) 226 kg
PVPR: 15.449€
Comments